Os dados divulgados pelo Censo Demográfico 2022 pelo IBGE lançam luz sobre a realidade urbana brasileira que precisa ser enfrentada com urgência. No Espírito Santo, apenas 16,6% da população reside em ruas com rampas de ibilidade. Isso significa que a imensa maioria das nossas cidades segue excluindo sistematicamente pessoas com deficiência, idosos e mães com carrinhos de bebê do direito básico de se deslocar com segurança.
A situação se agrava ao observarmos que 33,7% dos brasileiros vivem em vias públicas sem nenhuma arborização – e uma das cidades menos arborizadas do Brasil está justamente em território capixaba, Jerônimo Monteiro. Em um estado de clima tropical, onde o calor é cada vez mais intenso, a ausência de árvores compromete o conforto térmico, a qualidade do ar e, em última instância, a saúde da população.
O desenho urbano capixaba, especialmente nas áreas periféricas, reflete a histórica desigualdade no o à infraestrutura pública. Nas regiões mais pobres, é comum encontrar calçadas estreitas, mal conservadas, repletas de obstáculos e sem qualquer sombreamento. Enquanto isso, alguns bairros nobres ainda mantêm arborização razoável, calçadas amplas e algum nível de conforto para o pedestre.

Essa discrepância é o retrato de cidades que se organizam para poucos. Mesmo os espaços de lazer, como praças e parques públicos, são majoritariamente impermeabilizados, com pouca vegetação, contribuindo para o aumento das ilhas de calor e reduzindo a capacidade de absorção da água das chuvas, um fator que compromete diretamente a resiliência urbana diante dos eventos climáticos extremos que já estamos enfrentando.
Como arquiteta e urbanista, afirmo que esses dados não são apenas estatísticas: eles revelam a urgência de se pensar o espaço urbano a partir do pedestre. É preciso que a cidade seja desenhada com base na experiência cotidiana de quem caminha, espera o transporte público, cuida dos filhos e precisa ar serviços básicos.
Calçadas íveis, arborização adequada e espaços públicos qualificados não são luxo — são elementos essenciais de uma política pública de saúde, mobilidade e justiça social. O investimento em infraestrutura verde, ibilidade e ambiência urbana melhora a saúde da população, promove o bem-estar coletivo e fortalece a cidadania.
Nesse sentido, é indispensável que os municípios contem com profissionais de arquitetura e urbanismo em seus quadros técnicos, atuando com autonomia e responsabilidade no planejamento urbano. Somos nós, arquitetos e urbanistas, que temos as ferramentas para articular soluções que integram o desenho da cidade à qualidade de vida da população.
Reverter esse cenário exige compromisso político, investimento público e valorização da técnica. Afinal, construir cidades mais humanas começa pelo cuidado com aquilo que, todos os dias, está sob os nossos pés: o chão da cidade.
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